segunda-feira, 20 de junho de 2022

Colheita

 

A colheita de tudo o que você plantou

O cortejo fúnebre do que matou

As consequências de seus próprios atos e palavras

Ditas, gritadas, silenciadas, moídas entre os dentes

O futuro que você planejou

As tempestades que semeou chegando feito tormenta a sua janela

 

Não há nada aqui

Apenas aquilo que você mesmo quis

Apenas as mentiras que sussurrou, apenas as ilusões que vendeu

O solo morto onde já floriram rosas

Apenas as palavras que não diz

Apenas tudo aquilo que perdeu

 

Você foi alertado, avisado, reavisado

Não diga que tudo é súbito e inesperado

A paciência que descia lenta e silenciosa pela ampulheta do tempo

Esvaiu-se de só uma vez

E você, vendo tudo de seu trono esfarrapado de desculpas, exasperado

Nada fez

 

Não há nada aqui

Apenas aquilo que você mesmo quis

Apenas as mentiras que sussurrou, apenas as ilusões que vendeu

O solo morto onde já floriram rosas

Apenas as palavras que não diz

Apenas tudo aquilo que perdeu

 

É o que você sempre faz, fez, fará

O que repete de novo e de novo

Uma criança que não aprende, não importa quantas vidas lhe forem dadas

Novas chances não farão você mudar

Novas lições não farão você aprender

E o lugar na frente do quadro negro sempre terá

Mulheres cansadas, caladas, mal amadas

Um lugar onde não quero mais viver

 

Um lugar onde não quero mais viver

Me alforrio dessas correntes

Me livro desse karma

Me desfaço dessas dores

Enterro esse cavalo

Crio asas e voo pra longe.

 

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Nós

O passado correu em meu encalço o mês todo, e eu não pude escapar.

Estava lá nas fotos de anos atrás que ele teimava em fazer aparecer. Momentos felizes de união onde ninguém imaginava o curso que as coisas teriam. Festas, sorrisos, confidências, novidades. O futuro chegou e quebrou tudo isso em pedaços.

Eu não tinha ilusões que tudo ficasse como era, uma bolha de terno acolhimento e cumplicidade. As pessoas vão, outras ficam, nada é eterno. A vida segue. Mas o delicado fio conectando nossas vidas não foi ficando frouxo com o tempo pelo relapso desuso das conexões de ambos os lados, ele foi drasticamente interrompido, arrancado, cortado, de maneira traumática.

E quem cortou esse fio foi você.

Eu o segurei firmemente, como alguém que amarra um prédio em ruínas com laços de fita. As rachaduras estavam lá desde o começo, alicerces frágeis em fundações duvidosas, mas agarrei os pedaços de concreto com minhas mãos como se minha vida dependesse disso. E daí que éramos fundamentalmente diferentes? E daí que nossas opiniões divergiam, nossos sonhos não se encontravam, nossos idiomas não se entendiam? Se você estava ali, e eu também estava, havia uma razão.

Talvez eu teimasse em perceber que cada vez que essa ponte em terreno movediço desabasse mais um pouco, eu desistia um pouco de mim para que ela se mantivesse no lugar. Pequenas ideias, opiniões, gostos. Eu desisti de mim para não te incomodar, para me parecer com você e fingir que talvez nós, tão diferentes, podíamos ter tantas coisas em comum.

Mas eu notei tarde demais que me anular para te agradar sempre iria deixar sequelas. Servir de anteparo para seu espelho nunca foi um lugar muito digno, e quando esse espelho começou a refletir as coisas que você não queria ver, você jogou fora. E foi quando eu cansei de me calar que você se cansou de ver o que esteve ali o tempo todo.

Eu era o retrato apodrecido da imagem jovial e intacta, o reflexo real da beleza plástica e hipócrita que você carregava. A verdade doía, e a dor nunca lhe convém.

No final das contas, romper laços que apertam é um ato de liberdade inenarrável. Sou eu mesma hoje em dia, talvez mais quebrada em alguns lugares, mas dona de mim. Teu egocentrismo tóxico, teus preconceitos tortos, teu orgulho e teu temperamento me envenenaram tempo demais.


É por isso que te agradeço, ex-nó que me atava, por me libertar das amarras de pertencer à você.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Caramelo

A textura levemente áspera de seus cabelos nas pontas de meus dedos transmitem choques elétricos que ecoam direto na parte mais profunda do meu cérebro. Entrelaço-os em seus cachos, prendendo com firmeza. Enterro meu nariz em sua nuca, inalando a fragrância agridoce de perfume e suor. O caramelo dos seus olhos me encara com fervor, a luz amarela que vem da janela os fazem parecer duas pedras douradas que me encaram com desejo. Deito-me em seu peito e escuto ecos de seu coração descompassado, que acelera quando eu furtivamente planto beijos na base de seu maxilar áspero. Você ronrona, geme, reclama quando a mordida em seu lóbulo é mais forte do que você disse que poderia ser, e ignoro seus protestos mordiscando ainda mais. Você geme mais alto. Eu mordo mais forte. "Merece um castigo por isso", diz rouco entre suspiros, e eu digo que mal posso esperar. As mãos fortes em meu quadril fazem-me girar para esquerda para que você, deliberadamente, fique em cima de mim, me pressionando. "Virada de jogo", um aviso. É você quem me morde agora. A ferroada ácida de seus dentes em meu mamilo manda sinais confusos, mas não protesto. Sorrio, e meu sorriso faz seu rosto se derreter feito vela quente em dia de finados, um sorriso bobo de olhos redondos que não precisam me dizer mais nada, nada mais do que eles dizem agora. "Eu gosto, ", eu explico, "eu sei", você responde, e morde outra vez, no pescoço, e não é isso meu amor. Não é a delícia da dor que me agrada. São seus olhinhos bobos reluzentes que derretendo me fazem arder, uma bola incandescente cresce em meu peito quando me olhas assim, e não preciso de mais nada. De palavra nenhuma, de nenhuma promessa, tua face tão amável me conta todos esses segredos que você faz tanta questão em esconder. Beijo seus lábios que rescendem a chocolate e vinho merlot, e não há sabor mais inebriante. 

Tuas mãos habilidosas afagam meu seio esquerdo e escapa um suspiro profundo. Você adora, tu zombas. Não, não adoro, eu amo. Você ri, achando que falo meramente de suas habilidades, quando quero dizer que amo essa sua risada esquisita, teu cabelo bagunçado, e como você é tão esperto e tão burro ao mesmo tempo. Sua língua faz curvas em meu mamilo enquanto eu solto um gritinho ridículo, arfo meu peito em direção aos seus lábios, e fecho os olhos imaginando que me dizes o que quero ouvir. Você não irá dizer, eu sei, talvez porque não sinta, ou talvez porque minta, pra si mesmo e pra mim, e finjo que essas mentiras na ponta de sua língua são o suficiente.

Escapo de seus abraços, e levanto-me, para longe. Não ouso olhar-lhe nos olhos. Está escrito ali, todas as palavras mal ditas, as verdades dolorosas. O caramelo transforma-se em negro, nuvens cinzentas pairam em seu semblante enquanto visto minha roupa. Não me olhe assim, por favor. Vejo o nó de seus dedos esbranquiçarem, agarrando com força a beirada da cama desarrumada, como se segurasse a vontade de me pedir para ficar. O que foi?, você pergunta. Não fica assim, você pede. 

Não é nada, meu amor. Nada.

Não somos nada.

E fecho a porta atrás de mim.

Um novo começo

   Ensaios de uma Crise será, ou ao menos tentará ser, um blog-diário com crônicas, histórias curtas, frases ou qualquer produção literária que vier à mente. Uma tentativa de pôr em palavras os pensamentos tortuosos de alguém que sofre de ansiedade crônica, os sentimentos, aflições e cenários que transbordam da alma em palavras quando não se pode dizer mais nada. Uma tentativa também de divulgar os projetos literários em andamento - romances e contos que estão sendo escritos. 

   Sinta-se livre para comentar, sugerir, pedir, incomodar! - mas não incomoda. Qualquer feedback é muitíssimo bem-vindo e louvado, gaste três minutinhos de sua vida para comentar os mal fadados textos dessa escritora de meia pataca, pelo amor dos deuses! Não ligue para o layout capenga feito as pressas, perdi o groove de me aventurar nos HTMLs da vida (isso ainda existe gente?!) e é isso, por enquanto, querendo fazer uma doação simplória de acabamento de design estamos aceitando, de bom grado. 

   Não prometo atualizações constantes, porque de fogo de palha minha lista de blogs abandonados está cheia.  

   Nos vemos em breve,


  Aika